RESENHA: O Anel do Nibelungo - P. Craig Russel

      "O Anel do Nibelungo" é uma adaptação em quadrinhos da obra "Der Ring des Nibelungen", ópera dividida em quatro ciclos composta pelo alemão Richard Wagner durante o século XIX, e que por sua vez teve como inspiração os escritos da mitologia nórdica. Wagner levou longos 26 anos para compor todo o trabalho, sendo grande parte dele composto durante seu tempo de exílio político fora da Alemanha. A obra foi encenada pela primeira vez de forma completa em 1876 e sua apresentação durava cerca de 15 horas. Com toda sua riqueza musical e cênica "Der Ring des Nibelungen" se tornou um dos maiores épicos da arte de seu tempo e influenciou desde Nietzche até Tolkien.


      Adaptar uma ópera dessa magnitude para os quadrinhos com certeza não foi uma tarefa fácil, mas Craig Russel fez isso de forma impecável. O quadrinista não só adaptou a parte literária da obra de Wagner, isto é, os livretos que acompanhavam a ópera, como também adaptou a parte musical. Sim, Craig Russel traduziu as notas musicais, o crescendo e a calmaria de cada passagem. A duração, altura, intensidade e timbre responsáveis por dar dinâmica a música estão presentes também nas páginas de "O Anel do Nibelungo" em formas variadas, ora pelo tom da cor, ora pela composição de quadros, ora pela movimentação dos personagens ou de alguma outra forma mais sutil. E mesmo que você não seja músico será capaz de perceber as cadências e os momentos de explosão da música por traz dos quadrinhos durante a leitura.



      Um dos elementos que contribuem para a imortalidade da obra sem dúvida são os temas universais e atemporais presentes nela: a ganância, a inveja, a vingança, a busca pelo poder e também pelo amor, e é claro, as suas consequências. A trajetória do anel mágico e amaldiçoado começa quando o anão Alberich, da raça dos nibelungos, rouba o Ouro do Reno e a partir dele forja o anel, mas para isso ele precisa renegar o amor. Enquanto Alberich usa o poder do anel para subjugar os nibelungos e acumular riquezas, os gigantes Fasolt e Fafnir terminam de construir o salão de Valhalla para Voton (Odin) e exigem o seu pagamento pelo serviço. O acordo inicial era que o deus daria Freia, sua cunhada, como forma de pagamento aos gigantes. Mas através de Logé, Voton fica sabendo da existência do Ouro do Reno que está em posse dos nibelungos e parte numa jornada em busca do tesouro para dá-lo como pagamento aos gigantes no lugar de Freia. Ao ser subjugado e ver seu tesouro sendo tomado a força, Alberich amaldiçoa o anel mágico que agora é usado por Voton e desperta a sua ganância. A partir desse ponto vamos acompanhar os desdobramentos que o uso do anel irá desencadear em seu portador e aqueles que estão ao seu redor. O artefato vai passar por muitas mãos e por diferentes gerações, vamos acompanhar a história das Valquírias, o nascimento e ascensão do herói Siegfried e por fim o Crepúsculo dos Deuses. São mais de 400 páginas de muita aventura e alta fantasia, fazendo de "O Anel do Nibelungo" uma verdadeira epopeia.


      "O Anel do Nibelungo" é uma daquelas obras atemporais e universais que transcendem seu gênero e nos proporciona uma viagem por diversos outros caminhos, tamanha a sua riqueza. Não é raro, por exemplo, durante a leitura sentirmos a vontade de pesquisar mais sobre a mitologia nórdica ou se interessar por música clássica. A verdade é que depois de concluída a leitura nos sentimos mais ricos culturalmente. A ópera de Wagner é uma obra colossal que se tornou um alicerce para a confecção de diversas outras obras em diferente mídias, desde a literatura, como Tolkien e L. Frank Baum, até o anime, como no caso de "Os Cavaleiros do Zodíaco", que também bebe muito dessa fonte. Você provavelmente já ouviu a música de Wagner mesmo sem saber, é natural ouvirmos sua música de fundo nos desenhos animados da Looney Tunes. E quem nunca ouviu a Cavalgada das Valquírias? A famosa trilha sonora usada em diversos filmes como Apocalypse Now e Watchmen. Essa fiel adaptação de Craig Russel torna a obra de Wagner mais acessível sem perder a sua genialidade e originalidade. A edição do Pipoca e Nanquim traz alguns extras capazes de nos dar alguma noção de todo o trabalho que a adaptação exigiu, temos aqui detalhes sobre a concepção de transformar as notas musicais em quadros e também sobre o uso de modelos reais para desenhar alguns dos personagens. Toda a obra envolveu um trabalho gigantesco e o resultado é excepcional. O "Anel do Nibelungo" é um épico e um verdadeiro petardo.

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