RESENHA: As Portas da Percepção / Céu e Inferno - Aldous Huxley

      Em 1953, Aldous Huxley, escritor já renomado com obras como "Contraponto" (1928) e "Admirável Mundo Novo" (1932) em seu currículo, se submeteu a uma experiência com mescalina, um alucinógeno natural extraído do cacto peiote. O objetivo? Abrir as portas de sua mente. Huxley defendia a tese de que o nosso cérebro, com o intuito de nos preservar e garantir a nossa sobrevivência, age como uma espécie de válvula limitadora, um filtro, e que, por conta disso, nós não percebemos o mundo ao redor como ele realmente é. Assistido pelo psiquiatra Humphry Osmond, Huxley fez seus experimentos e os resultados podem ser conferidos em duas obras: "As Portas da Percepção" (1954), livro que se tornou um dos símbolos do movimento hippie; e "Céu e Inferno" (1956), um ensaio complementar. Ambos reunidos em um único volume lançado pela editora Biblioteca Azul, em 2015.

      "I. Alucinógenos e experiência religiosa. II. Efeitos psicotrópicos. III. Xamanismo." Essa é a classificação da ficha catalográfica do livro. Doido, né? Mas se você está pensando que o que temos aqui é uma espécie de diário de um drogado, se enganou. Huxley fez bem mais do que apenas descrever os efeitos causados pela mescalina. O que temos aqui é uma análise séria e aprofundada da mente humana. Temas como a arte e a religião também são debatidos. E, é claro, sendo Huxley, críticas sociais não faltam. Além do nosso próprio cérebro, Huxley acreditava que alguns elementos externos também podem agir como agentes limitadores, sendo o principal deles a própria sociedade. Vítimas de um sistema, nós acabamos por enxergar sob a lente dos conceitos impostos pela mesma. É preciso remover esse véu para ver a verdade.

      Essa foi uma leitura bem diferente, nunca tinha lido nada do tipo e gostei bastante da experiência. Apesar do tema central do livro ser o experimento do autor com a mescalina, ele vai bem além disso e gera um rio de reflexões sobre os mais variados assuntos. Aquilo que mais gosto na escrita de Huxley, que é o seu poder de nos fazer questionar o mundo ao redor e duvidar do que está bem debaixo do nosso nariz, se faz muito presente aqui. Nada pior do que a estagnação de uma cultura ou de uma sociedade, esse é o primeiro passo em direção a qualquer abismo mais obscuro que possa surgir adiante. Precisamos manter os olhos abertos, ou melhor, as portas, e para isso nada melhor do que ter um guru como Aldous Huxley, esse incansável despertador de mentes humanas.

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