RESENHA: : Uma Juventude na Alemanha - Ernst Toller


          Nascido em 1893, na região que hoje corresponde a Polônia, Ernst Toller foi um dramaturgo, poeta e político revolucionário do Império Alemão. Autor de peças como "Die Wandlung" e "Masse Mensch", se tornou um dos expoentes do expressionismo alemão. De origem burguesa judia, combateu na Primeira Guerra Mundial, experiência que o marcou profundamente e que o converteu ao pacifismo. Foi figura ativa no cenário político entre guerras da Alemanha, no qual chegou a ser presidente da República Conselhista da Baviera e condenado a cinco anos de prisão sob a acusação de alta traição. Em 1933, com a ascensão do nazismo, exilou-se na Inglaterra e posteriormente nos EUA, onde suicidou-se em 1939.

(Ernst Toller)

          Mais que uma autobiografia, "Uma Juventude na Alemanha" cobre os primeiros trinta anos de sua vida e um dos períodos mais conturbados da história da Europa. Toller inicia o livro evocando cenas de sua infância, onde a inocência é contrastada por uma atmosfera de medo, impregnada de xenofobia e intolerância religiosa. A asfixia do livre pensamento se fazia presente até mesmo nas escolas, onde os professores seguiam uma cartilha altamente conservadora e moralista, baseada no temor a Deus, e qualquer aluno que pensasse por conta própria era acusado de anarquismo. Toller, que queria se dedicar a poesia e ao teatro, se sentia um prisioneiro em sala de aula e foi buscar liberdade na França. Sob nova perspectiva, ele questiona seu país, e também a si mesmo, pela primeira vez. Justamente nesse momento acontece aquilo que mudaria definitivamente seu destino, eclode a Primeira Guerra.

          Inflamado pelo espírito patriota, Toller alista-se no exército e vai para o front. Todos os horrores da guerra são retratados com detalhes aqui e é dessa parte, sem dúvida, alguns dos relatos mais tristes e impactantes da leitura. De volta a seu país, Toller se converte ao pacifismo e, decepcionado com a classe artística, que prefere se isolar em seu "casulo teórico", se fazendo de cega, surda e muda, torna-se muito ativo politicamente e desempenha um importante papel na Revolução Alemã. Essa passagem gera algumas das melhores reflexões sobre o papel da arte diante de conturbados períodos históricos, e porque essa não só pode, como deve se envolver com política.


          Os escritos de Toller seguem de perto todas as convulsões políticas e sociais que marcaram a Alemanha pós-guerra. Greves, conflitos, assassinatos e tentativas de golpe, tudo é esmiuçado aqui. Por seu envolvimento em atividades socialistas e na greve dos trabalhadores, Toller é perseguido e, por fim, preso sob a acusação de alta traição. O período de cárcere é um dos mais duros e também tocantes da leitura. Aqui, Toller reflete sobre sua trajetória e escreve algumas de suas principais peças. Também tem seus direitos violados e é forçado a assinar transcrições adulteradas que incriminavam a si mesmo e a seus amigos.

          Apesar de centrado em um conturbado período da história alemã, o livro de Toller tem o poder de conversar diretamente com diversos outros contextos, inclusive com o Brasil atual. Logo no primeiro capítulo, o autor deixa vários alertas sobre a cegueira do patriotismo exacerbado, a crença em novos Messias, a asfixia da liberdade e a degradação dos valores intelectuais e morais. Leitura mais do que recomendada, e diria até necessária, para os dias atuais.


          Quanto a edição da Mundaréu, é simples, porém, bem feita e muito confortável de se ler. A obra integra a coleção "Linha do Tempo", que é focada em textos que retratam períodos históricos através da arte. O livro conta com tradução de Ricardo Ploch e traz como complemento o texto "Um Apolítico vai ao Reichstag", do escritor e jornalista austríaco Joseph Roth.



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