RESENHA: A Tempestade - William Shakespeare

"Sim, tudo, tudo um dia vai se dissolver.
Sem deixar para trás nem um rastro de névoa.
Nós somos da matéria de que é feito o sonho.
E nossa diminuta vida é circundada
Por um adormecer."

    
          O maior dramaturgo de todos os tempos, William Shakespeare nasceu em 1564, na cidade de Stratford-upon-Avon, Inglaterra. "O Bardo", como se tornou mundialmente conhecido, se estabeleceu em Londres durante o reinado de Elizabeth I e concebeu, entre os anos de 1590 e 1613, clássicos como "Romeu e Julieta", "Sonho de Uma Noite de Verão", "Júlio César", "Hamlet", "Otelo", "Rei Lear", "Macbeth" e "A Tempestade". Sua comédias, tragédias e sonetos investigavam a fundo os recônditos da alma humana, com todas as suas ambições, desejos, paixões e o absurdo da vida em si. Sua obra não apenas revolucionou a dramaturgia como influenciou gerações de artistas. Séculos depois, seus textos ainda são constantemente revisitados, seja no teatro, no cinema, na música, na TV ou na literatura, contribuindo para sua imortalidade.

          Considerado seu último texto redigido, "A Tempestade" é também a sua obra mais enigmática. Sua primeira encenação registrada consta de 1611, no palácio de Whitehall, na corte de James I, e suas origens são um tanto quanto nebulosas, uma vez que não se sabe ao certo quando começou a ser escrita, qual seria sua versão final e quais teriam sido as inspirações do autor. Ao longo dos anos, a peça foi objeto de inúmeros estudos e nunca se chegou a um consenso. Há aqueles que defendem a ideia de uma peça com teor religioso, outros apostam na política e no colonialismo, há ainda aqueles que interpretam "A Tempestade" como uma alegoria para a despedida do autor. Fato é que mais de quatrocentos anos depois a obra continua intrigando leitores de todo o mundo e comigo não foi diferente.

          Na trama, Próspero, o antigo duque de Milão, tem seu trono usurpado pelo próprio irmão e vive agora refugiado em uma ilha deserta, tendo como companhia sua filha, Miranda, e o escravo deformado, Calibã. Quando o acaso lhe concede a devida oportunidade, Próspero usa de seus poderes mágicos para fazer com que o navio que transportava seus traidores naufragasse na ilha, dando início a um nefasto plano de vingança. Aqui, o natural e o sobrenatural são colocados frente a frente. Seres fantásticos como bruxas e espíritos se misturam a reis, príncipes e bufões. A fantasia é contrastada pelas emoções que movem os corações humanos: ira, vingança, desejo, paixão, orgulho e perdão; enquanto Shakespeare, como um exímio enxadrista, move suas peças com maestria.

          "A Tempestade" é uma obra multifacetada que engloba elementos que Shakespeare abordou em toda sua carreira. Aberta a inúmeras interpretações, é praticamente impossível chegar a uma conclusão através de uma única leitura. Esse é, sem dúvida, um daqueles livros que precisamos revisitar de tempos em tempos. Mas não se engane, a leitura em si não tem nada de complexa. Com pouco mais de noventa páginas, a obra é de rápida leitura e não desprovida de humor. Uma vez enredado pela trama, se torna difícil deixar o livro de lado. A edição da Penguin conta com tradução, apresentação e notas de José Francisco Botelho e traz ainda uma rica introdução de Frank Kermode, quase cem páginas de uma análise aprofundada onde a obra é esmiuçada em seus mínimos detalhes (confesso que até exageradamente), sugiro deixar essa leitura para depois de lida a peça.



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