RESENHA: Contos de Odessa - Isaac Bábel


          Nascido em 1894, na região de Odessa (atual Ucrânia), Isaac Bábel foi um escritor e jornalista do Império Russo. Muito cultuado no Ocidente, o autor não teve a mesma sorte em sua terra natal. De origem judaica, enfrentou dificuldades desde o início de sua carreira. Começou publicando contos em revistas literárias, mas logo foi processado pela censura tsarista sob a acusação de pornografia. Desempenhou diversas funções, dentre elas a de tradutor, correspondente de guerra, roteirista e jornalista, nessa última também foi vítima da censura quando Lênin mandou fechar o jornal para o qual escrevia. Ironicamente, Bábel foi um simpatizante do governo stalinista, chegando até a trabalhar para a polícia secreta, mas isso não foi o suficiente para salvá-lo. Preso sob a acusação de terrorismo e atividades antissoviéticas, foi interrogado, torturado e, por fim, morto por fuzilamento, em 1940. Não satisfeito em tirar a sua vida, o regime totalitário soviético ainda mutilou a sua arte, apreendendo inúmeros manuscritos jamais recuperados, mesmo após a abertura dos arquivos da KGB. Sua obra publicada até então foi sumariamente proibida e relegada ao ostracismo. Para todos os efeitos, era como se Isaac Bábel nunca houvesse existido. Somente em 1954, após a queda do stalinismo, foi que a obra de Bábel, ou pelo menos o que sobrou dela, pôde ver a luz do dia em território russo.


          Publicado originalmente em 1931, "Contos de Odessa" reúne uma série de narrativas curtas, editadas anteriormente em revistas literárias. São histórias dotadas de um tom jornalístico e que têm como protagonista, é claro, a cidade portuária de Odessa, que no início do século XX fervilhava de comerciantes, marujos, trapaceiros, bêbados, bandidos, contrabandistas e judeus, muitos judeus. Com uma prosa seca e concisa, Bábel lança mão de personagens caricatos, como é o caso do malfeitor Bénia Krik, para tecer suas críticas sociais sem se privar do humor. O contexto histórico é ricamente explorado, com alguns contos se passando antes, e outros depois, da Revolução Russa. Temas como o Pogrom, termo atribuído à perseguição dos judeus na Rússia tzarista, ganham destaque. Conflitos,  atentados, pilhagens, estupros, linchamentos são retratados de forma nua e crua aqui. Bábel não alivia na violência.

          Conforme avançamos na leitura, vamos encaixando as peças desse intrincado quebra-cabeça que era a tumultuada Odessa do século XX e entendendo um pouco melhor os conflitos que assolam a região. Ao fim, percebemos o quão pouco a humanidade evoluiu, se é que não regrediu. Um século depois, minorias continuam sendo perseguidas e todos os dias nossa esperança em dias melhores é duramente desafiada. Nesse exato momento estamos mergulhados em uma guerra que atinge justamente a região da Ucrânia. Como dizia Gramsci: "A história ensina, mas não tem alunos."

Comentários