RESENHA: A Valise do Professor - Hiromi Kawakami


          Nascida em Tóquio, em 1958, Hiromi Kawakami é uma escritora japonesa muito celebrada no Oriente e laureada com importantes premiações, entre elas o Akutagawa (1996) e o cobiçado Tanizaki (2001). Sua escrita, concisa, é marcada pelo tratamento sutil de temas como o cotidiano, as relações pessoais, a sexualidade e a solidão. Publicado originalmente em 2001 e trazido ao Brasil pela editora Estação Liberdade, "A Valise do Professor" é um romance curto e de fácil leitura que, tendo como pano de fundo a rica gastronomia japonesa, vai falar sobre "ser sozinho". 

          Tsukiko é uma mulher comum às portas da meia-idade. Solitária, passa os seus dias entre casa, trabalho e as raras idas ao bar de Satoru. Introvertida, está sempre mantendo os homens a uma distância segura e tocando a vida sem grandes emoções, esquiva do mundo. Até que, um dia, se encontra com um peculiar senhor que foi seu professor no ensino médio. No balcão do bar, ambos descobrem compartilhar do mesmo gosto culinário e essa será a porta de entrada para uma relação, que não é de amizade, mas também não exatamente amorosa, difícil de definir.

          Entre saquês e petiscos (sério, esse livro dá fome), esses dois personagens solitários vão descobrindo afinidades e tendo uma aproximação de almas, acho que essa é a definição mais próxima que consigo chegar. Enigmática, a figura do professor guarda algumas excentricidades, como colecionar pilhas usadas, recitar poemas de forma aleatória e levar consigo sua misteriosa valise, aonde quer que vá. Já Tsukiko, que até agora acreditava estar levando uma vida feliz sozinha, começa a se questionar: "Afinal, como teria eu vivido até agora?" Prestes a completar 40 anos, se dá conta de que durante toda a sua vida construiu "muros de ar" em torno de si. Seria tarde demais para colocá-los abaixo?

(Hiromi Kawakami)

          Esse é aquele tipo de livro que pode ser lido como entretenimento, um passatempo gostosinho, ou, se lido no momento certo, pode realmente ajudar o leitor a resolver problemas internos. Medos, inseguranças, traumas e questões mal resolvidas, coisas que nos paralisam e que nos deixam, como último recurso, a construção de um sólido "muro de ar" ao redor. Somos humanos e estamos sujeito às intempéries da vida. Às vezes, um refúgio interno pode se mostrar necessário e até fazer bem, mas o problema é quando não encontramos mais a saída e ficamos presos, reféns de um redoma de sentimentos. A boa notícia é que essas barreiras podem ser quebradas, só precisamos entender um pouco melhor o seu mecanismo para encontrar o ponto de saída.

          É um livro que eu recomendaria para todos? Não, pois tem suas peculiaridades. É um romance parado, de pouca ação. A maior parte se passa entre silêncios e muito de seu significado está no não dito. A narrativa é muito sutil e bonita, mas não acredito que irá funcionar para todo mundo. Kawakami tem todo um cuidado especial ao descrever sobre elementos da natureza, a passagem das estações e a cozinha japonesa. O livro também tem um leve toque de realismo mágico. Então, não vá esperando nenhum grande plot, apenas se deixe imergir. Quem sabe o livro não mova alguma engrenagem no seu subconsciente?

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