RESENHA: Set the Boy Free, a Autobiografia - Johnny Marr


          Ele ganhou o mundo quando, ao lado de Steven Morrissey, fundou os Smiths, a banda que com suas harmonias alegres e letras melancólicas deu voz a toda uma geração e se tornou um dos maiores ícones da cultura pop dos anos 80. Mas a história de Johnny Marr não se resume ao extinto grupo. Nascido e criado em uma Manchester cinzenta, nos anos 60, já demonstrava certo fascínio pela música quando, ainda criança, passava um bom tempo colado às vitrines das lojas olhando para as guitarras. Em sua mão, o instrumento acabaria se tornando uma espécie de extensão de seu próprio corpo, um brinquedo, uma arma, ou talvez o principal meio pelo qual um garoto introvertido se expressa. Fato é que Marr se tornaria um dos mais inovadores e influentes guitarristas britânicos, sendo a sua contribuição para a música imensurável.

          Publicado originalmente em 2016, sua autobiografia acaba de chegar ao Brasil pelas mãos da editora Belas Letras. O livro narra suas memórias desde a infância, em Ardwick, no seio de uma família católica irlandesa, até a sua excelente atual fase em carreira solo, dando ênfase, é claro, a sua ascensão com os Smiths, a prolífica e peculiar parceria com Morrissey, e os fatos que levaram a banda à implosão total e definitiva em apenas cinco anos. A obra nos permite ainda acompanhar de perto as revoluções culturais que assolaram o Reino Unido nas últimas décadas, desde o surgimento do punk rock ao fenômeno do britpop, com Marr reagindo e refletindo sobre cada uma elas.


          Sua relação com outros músicos também é ricamente explorada e a narrativa nos presenteia com detalhes de suas incursões em outros mundos, como o do Talking Heads, Pretenders, The The, The Cribs, Oasis, Modest Mouse e muitos outros. Mergulhar em sua mente criativa é, sem dúvida, o que há de mais inspirador na leitura. Marr é do tipo que não se intimida em explorar novos territórios. Enquanto em estúdio, lugar onde passou (e ainda passa) a maior parte de sua vida, se recusa a repetir fórmulas e sempre está em busca de novos sons, ousando e experimentando... E essa é a característica definitiva que mais admiro em um músico: a mais completa incapacidade de permanecer em uma zona de conforto.

          Que sou fã de biografias, não é segredo pra ninguém, mas essa em especial me tocou bastante. E apesar de gostar dos Smiths, confesso que pouco sabia sobre o seu guitarrista. Não fazia ideia, por exemplo, de que ele fosse vegano, praticasse corrida, lesse Aldous Huxley e tivesse um projeto de dance music. Também gostei de conhecer um pouco mais do seu lado humano nos momentos em que fala sobre casamento e paternidade. Me identifiquei com ele em muitos pontos e compartilho um pouco de sua filosofia de vida. Sem dúvida, uma das biografias mais marcantes e inspiradoras que já li! E para tornar a experiência ainda mais completa, o livro traz um belo arsenal de fotografias.

          Uma história de paixão pela música, perseguição de um sonho, aprendizado, amadurecimento, e que ajuda a contar um importante capítulo da cultura pop. É impressionante como biografia de músico é uma coisa que me levanta. Vejo minha coleção de CD's e minhas guitarras com outros olhos e me sinto inspirado, com vontade de ir atrás de novos sons e descobrir coisas. Ler sobre música simplesmente me faz bem! Obrigado, Johnny Marr.




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