RESENHA: Elvis, Último Trem para Memphis - Peter Guralnick


          Elvis Presley faz parte daquela seleta lista de artistas que transcenderam o seu tempo e se tornaram ícones. Símbolo de toda uma geração, sua imagem, ainda hoje, é cultivada ao redor do globo, seus passos atrevidos jamais são esquecidos e, enquanto as modas vêm e vão, sua música permanece. Elvis vive! Mas e quanto ao homem por trás do mito? O que se sabe sobre ele? Inúmeros livros já foram escritos sobre Elvis, mas a obra de Peter Guralnick, autoridade máxima em "tradições musicais entrelaçadas de negros e brancos da nação estadunidense", chega com o status de biografia definitiva do rei.

          "Último Trem para Memphis" é o primeiro de dois volumes e cobre um período de dez anos da vida de Elvis Presley (1948-1958), desde a sua mais tenra infância em Tupelo até o seu recrutamento para o exército norte-americano, passando por episódios memoráveis como o dia em que entrou no estúdio da Sun para sua primeira gravação ou quando se reuniu com Carl Perkins, Jerry Lee Lewis e Johnny Cash para uma jam session. A relação com os pais e com as muitas namoradas, a forma como conheceu figuras chave em sua carreira (como o visionário Sam Phillips e o polêmico Coronel Tom Parker), tudo é relatado aqui! Inclusive, a obra não alivia seu lado mais "feio" (entenda-se ciumento e possessivo). Mas o maior destaque, claro, fica por conta de sua ascensão meteórica e a transformação em um dos maiores ícones da cultura pop.




          Presley cresceu em um EUA pós-guerra onde o clima era de otimismo (embora as coisas não fossem fáceis para sua família), mas fortemente marcado pela segregação racial. E na música a coisa não era diferente. Mas, nas mãos, ou melhor, na voz do tímido jovem de Tupelo que começou cantando música gospel nas igrejas, a música acabaria se tornando uma importante ferramenta capaz de quebrar  qualquer barreira racial. Com uma narrativa vívida e altamente imersiva, o livro de Guralnick consegue nos transportar para as ruas de Memphis e nos permite acompanhar de perto o contexto social, político e cultural no qual surgiu Elvis Presley. Fato é que o povo ansiava por um ídolo, algo que desse vazão ao sentimento de euforia e liberdade que ainda estava reprimido, embora já em vias de erupção. E Elvis foi o estopim.

          Com sua música e seu gingado, ele chocou, incomodou e encantou. Foi acusado pelos mais conservadores de corromper a juventude e os valores sociais. Em suas apresentações o público feminino beirava a histeria coletiva. Do gospel ao rock 'n' roll, passando pelo country, rockabilly, blues, soul e muitos outros gêneros, sua música não aceitava rótulos e tinha um poder sem igual de se conectar ao ouvinte. Ninguém entendia o que estava acontecendo! Nas palavras de Roy Orbison: "Eu simplesmente não sabia como processar aquilo. Não havia um ponto de referência na cultura para compará-lo." Entender o fenômeno Elvis não é tarefa simples e talvez nem seja possível. Mas o simples exercício de pensá-lo já vale a experiência. E conhecer o homem por trás do mito, com todos os seus defeitos e seu lado humano expostos, não tem preço.




          Importante destacar que essa é uma biografia extremamente minuciosa. Tive a oportunidade de ler outros livros sobre Elvis, mas nenhum chega perto desse. Com mais de 600 páginas e cobrindo apenas dez anos da vida de Elvis, tudo é muito detalhado: a infância, o ambiente familiar, as paqueras, as sessões de estúdio, os bastidores de turnês, as apresentações históricas, os rebuliços na imprensa, as filmagens para o cinema, os dias no exército... Logo, não é um livro que eu recomendaria para quem é apenas curioso (pois a leitura pode se tornar um pouco arrastada em alguns pontos), mas principalmente para aqueles que são realmente fãs ou que têm uma relação mais estreita com a música e guardam interesse por esse período em específico. Inclusive, o livro dá uma bela amostra de como funcionava a indústria musical dos anos 50, na época muito focada nos singles.

          Ansioso pelo segundo e último volume dessa que é a trajetória de um dos maiores ícones da música. E enquanto ele não chega (a previsão é para agosto), sigo me perdendo entre as belas canções eternizadas por Elvis. Música boa não irá faltar... A obra faz jus ao status de biografia definitiva que vem recebendo. Os dois volumes sem dúvida se tornarão itens obrigatórios na estante de qualquer fã ou estudioso de música!



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