RESENHA: Nove Histórias - J. D. Salinger


          Após a publicação de seu primeiro e único romance, "O Apanhador no Campo de Centeio", em 1951, Salinger publicou uma série de contos. "Nove Histórias", como o próprio título já diz, traz nove narrativas curtas, a maioria delas ambientada nos EUA do período pós-guerra, que passeiam por temas como dramas familiares, a perda da inocência e a desilusão com a vida adulta. São histórias que têm como protagonistas veteranos que sofrem de estresse pós-traumático, mães solteiras, adolescentes deprimidos e crianças que, com sua inocência, contrastam com o mundo em caos ao seu redor. O livro também marca a estreia da família Glass na obra de Salinger, núcleo ao qual o autor retornaria em escritos posteriores. Para aqueles que leram "O Apanhador", alguns de seus traços característicos podem ser encontrados aqui: o clima de depressão adolescente, o supra-sumo do sarcasmo e as afiadíssimas críticas sociais.

          Assim como "O Apanhador", que aliás é o meu livro favorito, "Nove Histórias" é um livro que pode não agradar leitores de primeira viagem. Salinger é dono de uma escrita peculiar, super-adjetivada e temperada com um humor ácido, muito característico, e que simplesmente não funciona para todo mundo. Apesar de aclamado, é um livro que conversa muito com sua época e é necessário que haja contextualização. Vai tocar em alguns pontos mais sensíveis, como suicídio e crianças em situação de risco. Alguns dos personagens fazem o arquétipo de bomba relógio e injetam certa dose de medo e tensão na narrativa, a sensação é de que podem perder as estribeiras a qualquer instante (como às vezes perdem, de fato). A linguagem chula também dá as caras, aqui e ali. Enfim, são contos propensos a dividir bastante as opiniões. Você pode ler e achar genial ou simplesmente esquecê-lo no dia seguinte, vai depender do nível de conexão que conseguir criar com os personagens e o seu envolvimento com o drama de cada um deles.


          Meus contos favoritos foram: "Um dia perfeito para peixes-banana" (retrata o trauma pós-guerra de uma forma impactante e diria até perturbadora), "O Gargalhada" (um estranho grupo de crianças que compartilham de um gosto pra lá de duvidoso), "Para Esmé - com amor e sordidez" (a tocante troca de correspondência entre uma garotinha e um soldado veterano), "O período azul de Daumer-Smith" (o deprimente relato de um jovem debutando na vida adulta) e "Teddy" (esse destoa completamente dos outros e debate questões mais filosóficas e espirituais). São contos bem diferente entre si, mas que têm em comum personagens mergulhados em conflitos internos vivendo em uma época confusa, assim como era o próprio Salinger, que anos mais tarde renegaria a própria fama e se tornaria um recluso completo. Um clássico nunca é um clássico por acaso. Pesados os prós e os contras, é uma leitura que ainda assim recomendo. Por ser um livro rápido de ler, não custa nada dar uma chance. No mínimo, você terá uma experiência de leitura interessante.

         Não sei como é o original, mas a edição da Todavia não traz sinopse, nem texto nas orelhas, nada sobre o autor, nada de extras, introdução? nem pensar! Absolutamente nada além dos contos! Por se tratar de uma obra aclamada e que recorrentemente é material de estudo, achei isso meio decepcionante. Resta saber até que ponto isso pode ter sido uma exigência do licenciante... Mas que a obra merecia uma edição mais caprichada, ah isso merecia!

Comentários