RESENHA: Paul em Casa - Michel Rabagliati

          Paul é alter ego do quadrinista canadense Michel Rabagliati, duas vezes premiado no Festival de Angoulême. O personagem, que possui toda uma série baseada em diferentes momentos de sua vida, se encontra aqui, aos 50 e poucos anos, no fundo do poço. Ainda tentando digerir um divórcio, Paul passa seus dias envolto em solidão e nostalgia, à espera da filha que raramente vem visitá-lo e acompanhando a mãe no tratamento de uma doença terminal. Em seu jardim as plantas estão morrendo, a água da piscina está sempre turva e os brinquedos que outrora foram a alegria da família estão enferrujados, as noites são mal dormidas e sua saúde vai de mal a pior. Pra completar, ele se sente deslocado em um mundo com tantas mudanças para assimilar. É, o melhor da vida parece mesmo já ter ficado pra trás para o nosso Paul...

          Apesar de toda a dor, o quadrinho não é desprovido de humor. A narrativa é suavizada por não raros momentos de descontração - destaque para o cãozinho Biscoito - e flui esplendidamente. Outra coisa que chama a atenção é a verossimilhança do protagonista. Rabagliati, fugindo do estereótipo melodramático, dota seu alter ego de muita humanidade. Paul tem seus defeitos, ele é mal-humorado, avesso a mudanças e, por vezes, até um pouco conservador, mas também é um pai carinhoso e um filho dedicado, que apesar de suas fraquezas está tentando tocar a vida. Acompanhá-lo em seu cotidiano aproxima muito o leitor da obra, que mesmo tendo como cerne a crise da meia-idade não deixa de conversar com as ansiedades, inseguranças e frustrações que enfrentamos ao longo da vida, seja na idade que for.

          É um quadrinho que vai falar sobre depressão, luto, relacionamento, paternidade, envelhecimento e recomeço. Ao longo da narrativa, Rabagliati também trabalha com algumas simbologias: a macieira que está apodrecendo, a luta para tentar manter a piscina limpa, o tratamento dentário a que Paul se submete, entre outras coisas, nada mais são que reflexos de uma vida à deriva. Quanto a arte, tem um quê de cartunesca e remete aos clássicos franco-belgas, estilo mais minimalista que deixa o destaque para o desenrolar da história e que me agrada bastante. "Paul em Casa" é uma obra poética, doída mas bonita, e que não tem nenhuma pretensão de dar uma resposta definitiva ou uma fórmula pronta para superar os desafios, é mais um retrato do que a busca por uma solução, mas também não deixa de apontar caminhos possíveis e trazer algum conforto para aqueles que estão atravessando um momento de escuridão.







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