RESENHA: A Rosa do Povo - Carlos Drummond de Andrade

          Publicada originalmente em 1945, "A Rosa do Povo" é a mais extensa obra do poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, radicado na então metrópole Rio de Janeiro. Composta por 55 poemas, a coletânea é marcada por duas vozes poéticas: uma mais intimista, onde prevalecem as questões existenciais, tão caras a Drummond; e outra mais coletiva, ou de cunho social, onde o poeta assume a voz do "povo", que não está no título do livro por acaso. O volume também é marcado por composições de maior fôlego, com versos mais extensos e algumas poesias chegando a marca de dez páginas, o que era bastante incomum na obra drummondiana publicada até então. Há também muitos poemas que conversam entre si, não sendo raros os momentos em que uns jogam certa luz sobre outros, fomentando a ideia de um todo e permitindo uma maior compreensão da obra.

          Um Drummond diferente... Aqui o poeta está claramente mais ligado a questões ideológicas e sociais de seu tempo. Sua típica melancolia se junta ao tédio para compor um quadro de desolação perante um mundo enfastiado, marcado pela dureza da rotina e a violência da grande metrópole. É o clássico conflito "eu e o mundo" dotado de um lirismo social. Drummond também reflete sobre os desdobramentos acerca da Segunda Guerra Mundial, que caminhava para o seu fim após a derrota das tropas nazifascistas em Stalingrado. São poemas que captam muito do espírito do povo brasileiro em meio às notícias que chegavam do leste europeu. Há ainda espaço para duas homenagens: uma ao amigo Mário de Andrade e outra a ninguém menos que Charlie Chaplin, na qual Drummond aproxima a magia do cinema à da poesia.

          Venho tentando ler a obra de Drummond em ordem cronológica, ao menos os livros que tenho aqui na pilha, e o que percebi em relação aos trabalhos anteriores é que, além de uma variedade muito maior de temas, "A Rosa do Povo" também abre um vasto leque de recursos poéticos usados pelo autor. Claramente mais maduro, o poeta demonstra pleno domínio das formas de se fazer poesia e lança mão de metalinguagem, versos brancos, metáforas, elipses, etc. Como resultado, temos uma leitura um pouco mais complexa, e diria até introspectiva, em relação aos volumes anteriores. Confesso que senti certa dificuldade em me conectar com alguns dos poemas aqui presentes e a afinidade só veio depois de um bom número de páginas, quando a gente já começa a fazer alguma ideia do todo. O livro é um divisor de águas na carreira do poeta e, por que não?, na poesia brasileira do século XX, mas ainda prefiro o Drummond mais intimista e irônico de "Alguma Poesia". Ainda assim, "A Rosa do Povo" tem lá os seus poemas que carregarei comigo.






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