O horror foi um gênero muito importante na minha trajetória enquanto leitor. Além de ser um dos responsáveis por despertar o meu gosto pela leitura, houve uma época em que o gênero dominava a minha estante. Aos poucos, porém, as leituras foram ficando mais espaçadas e, dando lugar a outros estilos, o horror acabou ficando relegado às prateleiras inferiores, com leituras cada vez mais esporádicas. Mas nunca deixei de gostar inteiramente e, buscando uma reaproximação, resolvi encarar este livro que já estava encalhado havia algum tempo na minha estante. E como me arrependi de não ter lido isso antes!
Com curadoria de Alberto Manguel, o volume reúne 33 narrativas curtas (algumas nem tanto) que exploram os diferentes meios de se provocar repulsa, asco e medo. Artefatos amaldiçoados, vampiros, pragas, possessões demoníacas, mansões mal assombradas, o mundo dos sonhos e o enigmático desconhecido... O cardápio é vasto e não se atem ao sobrenatural, afinal, o que é o fantástico perto da perversidade humana? Aqui, a ganância, a inveja, o ódio e o amor não correspondido muitas vezes guiam pessoas às raias da loucura, levando-as a cometer os atos mais perversos e hediondos. Além de aspectos fantásticos e psicológicos, a obra também explora contextos históricos como a Revolução Industrial, a Inquisição, o Pogrom russo e a Revolução Francesa, reforçando a existência do horror dentro da nossa sociedade ao longo da história.
Cada narrativa é precedida por um breve texto de apresentação do tradutor, que varia de acordo com o conto. São histórias de altíssimo nível e que cobrem diferentes estilos, épocas e nacionalidades, ideais de se ler antes de pegar no sono (garantia de bons sonhos!). Algumas das minhas favoritas foram: "A última visita do Cavalheiro Doente", "A fera", "A casa de Bulemann", "O tarn", "O amigo dos espelhos", "O que foi aquilo? Um Mistério" e "Os fatos no caso do Sr. Valdemar" (que eu já devo ter lido uma meia dúzia de vezes e nunca deixa de me impactar). Minha única ressalva, não por cinta da qualidade, fica para "A volta do parafuso", que, com mais de cem páginas, destoa completamente do todo, soando cansativa em meio às narrativas mais curtas. Além de injusto com a novela de James, só serviu pra cansar o leitor encaixá-la aqui. Bola fora!
Com nomes consagrados como Poe, Wells, Conrad, Bierce, James, Verne, Maupassant, Stoker, Doyle, Stevenson e outros não tão conhecidos do público brasileiro, a obra traz horror para todos os gostos e se revela uma ótima porta de entrada para aqueles que desejam adentrar o gênero, bem como uma peça indispensável na estante dos já aficionados. E aqueles que acham que história de terror é tudo igual - "só pra assustar" - terão uma grata surpresa ao se deparar com as camadas filosóficas, psicológicas e sociais por trás dos contos aqui presentes. É o tipo de livro para se degustar aos poucos e se regalar com algumas das melhores narrativas de horror que o século XIX nos deu. A coletânea integra a charmosa "coleção listrada" da Cia. das Letras, que tem como marca registrada as traduções renomadas e um formato acessível que, fugindo ao luxo, prioriza a experiência de leitura. Leitura essa mais do que recomendada!
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