RESENHA: O Preço da Desonra - Hiroshi Hirata


          No Japão feudal, quando um samurai caía no campo de batalha e o medo da morte falava mais alto, sua última saída era recorrer à uma atitude vergonhosa e que colocava em cheque toda a sua honra: oferecer uma quantia em dinheiro em troca de sua cabeça. Uma promissória de vida era então assinada com sangue ali mesmo, no calor da batalha, e o infeliz era poupado. Ao fim da guerra, a dívida era cobrada. Esse estranho e obscuro "comércio" não só revela aquele que talvez seja o medo mais primordial do ser humano (a morte), como também escancara o seu lado mais mesquinho (a cobiça). Apesar dos relatos oficiais serem escassos, não é de se admirar que essa prática fosse comum. E é dela que surge a temível figura do tomador de promissórias, profissional que era contratado para efetuar essas cobranças e que protagoniza as sete histórias aqui contadas.


          Publicadas originalmente entre 1971 e 1973, são narrativas que partem sempre de uma mesma premissa: o tomador Hanshiro indo cobrar os devedores. Porém, as coisas nem sempre saem como o planejado. Um guerreiro caído poderia, por exemplo, assinar a promissória com um nome falso. É o que acontece no conto que abre o volume. Um ato de covardia que coloca em risco a honra e a sobrevivência de todo um clã. Ou então a história do pai que se vendeu, não por medo da morte, mas pelo filho que agora se volta contra ele. E assim vai... O ronin devedor morto pelas mãos de um cruel conselheiro do governo, o ex-bushi que se refugiou nas montanhas e achou que nunca seria encontrado, o ancião sem braços nem pernas e que não tem como arcar com a dívida, a família arruinada mas tão fortemente apegada aos seus princípios que prefere cometer o seppuku do que carregar a infâmia e o servo que se infiltra em um clã rico e sanguinário em busca de vingança.


          Mesmo tendo um ponto de partida em comum, Hiroshi Hirata consegue fazer com que cada narrativa seja única, dotando-as de desdobramentos bem distintos entre si. Apesar disso, é uma leitura que funciona melhor se intercalada com outros materiais ou pelo menos espaçada entre um conto e outro, pois, se lidas em sequência, podem soar um pouco repetitivas. Mas nada que comprometa.

          É uma obra que permite uma boa imersão na história do Japão feudal e no contexto dos samurais, com todos os seus códigos, crenças e costumes. Tudo isso acompanhado de uma arte soberba, ricamente trabalhada nos detalhes, nos cenários, nas cenas de ação e na expressão dos personagens. Sangue e violência saltam aos olhos, mas esse não é um mero mangá de pancadaria. Com dramas familiares e cenas tocantes, é também uma obra que reflete a condição humana e as forças que movem um homem. E é, acima tudo, uma obra que levanta a questão: "Quanto vale uma vida?"







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