RESENHA: Eugénie Grandet - Honoré de Balzac


          Publicado originalmente em 1833, "Eugénie Grandet" é um dos primeiros romances da chamada "Comédia Humana", como é conhecida grande parte da obra balzaquiana. A trama se desenvolve em Saumur, uma cidadezinha do interior onde vivem os Grandet. O patriarca da família é um vinhateiro avarento que rege a casa com ares de despotismo, condenando sua esposa e filha à uma vida próxima da miséria, enquanto enche os próprios bolsos de ouro. Mas numa cidade pequena é difícil esconder segredos e o povo de Saumur desconfia de sua riqueza. Por isso, a mão de sua filha Eugênie é muito cobiçada, especialmente pelos Cruchot e os des Grassins, duas famílias rivais. Ambos os pretendentes tentam cair nas graças do velho Grandet, mas esse "teatrinho" logo é perturbado pela chegada de um novo personagem: um primo dos Grandet, vindo de Paris. A chegada do jovem com ares de Don Juan altera drasticamente a rotina da casa e também o coração da pobre Eugênie.

          Tem início então todo o drama e sofrimento típicos dos romances do século XIX. Mas essa não é uma história de amor. Balzac vai muito mais fundo e destrincha o ser humano em seu âmago, para assim melhor analisá-lo. O contraste entre capital e província que a obra evidencia rende um fiel retrato do que era a França pós-napoleônica. A vida conjugal e o papel da mulher na sociedade do século XIX também vêm à tona. Com pinceladas de humor, Balzac ridiculariza as hipocrisias das convenções sociais e a rigidez dos costumes e políticas daquela época. Aqui, o homem e suas motivações sãos postos a nu e dissecados pelo autor, observador arguto do comportamento humano e da sua relação com o meio em que vive.


          Importante mencionar que o primeiro terço do livro não faz jus ao que vem pela frente e pode soar um pouco monótono, com descrições um tanto enfadonhas. Mas isso parece ser proposital, pois com a chegada do primo do exterior é que a trama realmente começa a se desenrolar e a leitura passa a fluir de forma esplêndida. A chegada do primo não só acaba com o marasmo do interior, como também muda o tom da narrativa. A ironia de Balzac é um show à parte e deixa suas críticas ainda mais afiadas, além de bem-humoradas. A obra também é dotada daquele poder dos clássicos: o de se manter atual; pois muitas de suas críticas, principalmente aquelas relacionadas ao dinheiro e a influência deste nas relações políticas e pessoais, permanecem atuais, tornando os Grandet e aqueles que o cercam facilmente reconhecíveis no meio em que vivemos.

          "Eugênie Grandet" é considerada uma das obras-primas do autor. Não li tanto Balzac assim para poder opinar com propriedade, mas li "Ilusões Perdidas" e achei anos luz à frente deste aqui, embora poucos anos separem uma publicação da outra. Se você já leu Dickens, vai parecer que está lendo um romance dele. Não por acaso o escritor vitoriano tem em Balzac uma de suas principais influências. É um livro que ajudou a moldar as bases do realismo que tomaria de assalto o século XIX. Logo, se trata de uma obra de suma importância, principalmente pra quem gosta desse tipo de literatura. É um livro que pode não ser perfeito, como apontado pelo próprio autor no epílogo desta edição, mas é aquilo, ler Balzac é sempre um prazer! Quanto à edição da UNESP, segue o padrão da coleção "Clássicos da Literatura" e conta com tradução de Fernando Santos, prefácio e epílogo redigidos pelo próprio autor.

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