Neste volume veremos, pela segunda vez desde o início da série, Ken Parker fora de seu habitat natural. Isso já havia acontecido em "Homicídio em Washington", quando nosso herói foi ao Parlamento lutar pelos direitos dos povos originários. Dessa vez, os cenários são o vasto oceano e as terras geladas do Alasca. Em "Caçada no Mar", Parker é engajado à força para fazer parte da tripulação de um navio baleeiro. Destacando as agruras da vida em alto-mar e a complexa relação entre seres humanos em uma situação extrema, onde as leis terrestres não fazem muito sentido, a história bebe da fonte de "Moby Dick", com direito até mesmo a um capitão cruel e ambicioso com ares de Ahab. O roteiro de Berardi ainda nos proporciona uma profunda reflexão sobre a relação homem x natureza e as consequências da exploração desenfreada dos recursos naturais. Como um apaixonado por literatura marítima, sou suspeito pra dizer, mas essa com certeza figura, ao lado de "Chemako", entre as minhas histórias favoritas da série até o momento.
Já em "Terras Brancas", Parker visita as geleiras do Alasca. Temos aqui uma história de sobrevivência com alta carga de dramaticidade. Desprovidos dos recursos mais básicos e isolados da civilização, nosso herói e seus amigos travarão uma árdua batalha contra o frio, a fome, o cansaço e o desespero em um ambiente inóspito e selvagem. O destaque aqui vai para o esquimó Nanuk, personagem inspirado em Dersu Uzala, protagonista do filme soviético-japonês de mesmo nome. Nanuk é um oriental dotado de cultura, crenças e uma visão de mundo e da natureza completamente diversas de nós, ocidentais. Isso gera um contraste enorme com a filosofia de vida de outros personagens (e até algumas intrigas) e convida o leitor a refletir sobre temas como altruísmo, fé e morte. A aventura é sutilmente suavizada por passagens poéticas e momentos de descontração. Só achei a trama um pouco repetitiva, com muitas cenas dos personagens andando incansavelmente sob a neve, mas isso não apaga nenhum pouco o brilho da história. Só a presença de Nanuk, com todo o seu conhecimento, poesia e humor peculiar, já vale a leitura!
Duas aventuras muito bem escritas, ambas roteirizadas por Giancarlo Berardi e desenhadas por Giancarlo Alessandrini e Bruno Marrafa, respectivamente, e que fogem completamente do gênero de faroeste. Essa incursão fora do western me agradou bastante e já deixou mostras de que a série é capaz de surpreender o leitor a qualquer momento, guiando Ken Parker por caminhos imprevisíveis e que, mesmo tortuosos, ajudam a moldar a sua formação de caráter. Esse desenvolvimento do personagem, aliás, tem sido um dos pontos altos da série pra mim. Perceber o amadurecimento do nosso herói, sempre disposto a aprender, seja com os ensinamentos que recebe ou com os próprios erros, acaba sendo um aprendizado também para nós, leitores.
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