RESENHA: Bilhões e Bilhões - Carl Sagan

          Não sei porquê demorei tanto pra voltar a ler Carl Sagan depois de "Cosmos", uma das melhores coisas que já li na vida e que me abriu a mente para todo um leque de assuntos e questionamentos. "Bilhões e Bilhões", apesar de diverso, é tão interessante quanto. Esse é o ultimo livro de Sagan, publicado originalmente em 1997, após a sua morte. A obra compila uma série de dezenove artigos escritos pelo cientista, professor, escritor (e muitas outras coisas). São textos que passeiam pelos mais diversos temas, entre eles: astronomia, política, história, sociedade e meio ambiente. Apesar de publicado de forma póstuma, Sagan trabalhou, com a ajuda da esposa, na concepção da obra e isso deu ao livro um claro tom de "mensagens para as gerações futuras", o que faz dessa uma leitura altamente recomendada se você almeja se tornar um ser humano melhor.

          É difícil falar sobre todos os temas que compõem o livro (não se deixe enganar pelo tamanho diminuto, a obra é riquíssima!), mas a maior parte dele é dedicada a questões ambientais, como o aquecimento global, o buraco da camada de ozônio e a exploração desenfreada dos recursos naturais. Sagan não só alerta sobre esses problemas, como também propõe o que pode ser feito na prática para solucioná-los, seja em âmbito pessoal, social ou industrial. Cabem ainda fortes críticas à corrida armamentista e à indústria da guerra. O autor também dedica todo um capítulo ao negacionismo científico e analisa as motivações e os interesses por trás deste. Mas, apesar de todas as críticas, é nítido que Sagan acreditava na futura cooperação entre nações para a solução dos problemas que assolam a Terra, aliás, mais que isso, ele aponta essa cooperação como um dos pontos-chave para a nossa sobrevivência. Só me pergunto se ele ainda teria esse mesmo otimismo se estivesse aqui hoje...

          Com uma escrita didática e inteligente, ora provocativa, ora bem humorada, Sagan consegue guiar o leitor por temas variados, alguns deles bem delicados, como é o caso do aborto, e trazer ensinamentos e questionamentos valorosos. Mas, mesmo com toda a abrangência, os artigos não soam desconexos entre si, há sim um fio condutor por trás deles. Fio este que desemboca no emocionante e triste capítulo final, redigido no leito de morte do autor e que reflete a finitude do ser humano. Com uma impressionante resiliência, Sagan discorre sobre a própria morte e em uma de suas últimas passagens evoca Albert Einstein: "Não consigo conceber um deus que recompense e puna as suas criaturas, nem que tenha uma vontade do tipo que experimentamos em nós mesmos. Não consigo, nem quero conceber um indivíduo que sobreviva à sua morte física; [...] Eu me satisfaço com o mistério da eternidade da vida e com um vislumbre da maravilhosa estrutura do mundo real, junto com o esforço diligente de compreender uma parte, por menor que seja, da Razão que se manifesta na natureza."

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